Reportagem especial 2 – Evando Queiroz conta como a experiência de Porto Nacional favoreceu a articulação para o SIMED-TO

Primeiro secretário da história do sindicato, médico goiano relembra bastidores das discussões antes da criação da entidade em 1989
20/03/2024 01/04/2024 16:35 171 visualizações
O primeiro nome da lista de fundadores do Sindicato dos Médicos no Estado do Tocantins (SIMED-TO) é o do médico Evando Queiroz. Ele foi um dos articuladores na criação da entidade e se tornou o primeiro secretário-geral nas eleições disputadas no dia 18 de março de 1989, data da fundação do sindicato. Queiroz é o personagem desta segunda reportagem especial da série publicada ao longo da semana, sobre o nascimento do movimento médico tocantinense, no ano em que o sindicato completa 35 anos.
 
 
Nascido na região de Goiânia em 21 de junho de 1958, Evando Queiroz  conta ter visto o pai perder as terras após problemas em uma hipoteca e decidido fazer uma faculdade.
 
Bom de matemática, por orientação de parentes decidiu pela Medicina. Ingressou na turma de 1978 na Universidade Federal de Goiás. Estudava durante o dia e à noite trabalhava de motorista de táxi. Ele se formou em 1984.
 
Durante sua atuação no interior do Estado de Goiás, o futuro secretário do SIMED-TO viveu a experiência sindical de atuar no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itapuranga. A moibilização o levou para dentro do Movimento Popular de Saúde, o MOPS, vigorosa articulação naqueles anos 1980 que antecederam a Constituinte que criaria o Sistema Único de Saúde (SUS).
 
Pelo movimento, estava sempre em Brasília para as conferências nacionais de saúde como coordenador do MOPS. Em uma dessas, articularia sua transferência para Porto Nacional, na época da criação do Estado do Tocantins, a partir da divisão do estado de Goiás.
 
“Minha chegada em Porto foi estranha, o ambiente político ali, foi tão diferente, que eu tive que usar o nome de outra pessoa pra me indicar pra ir pra lá, o Neilton[Araújo de Oliveira]. Eu conhecia o Neilton. E o Neilton fez as articulações para que o Merval Pimenta me indicasse para ir pra Porto Nacional”.
 
Evando e Neilton se conheceram em Itapuranga. Evando atuava no trabalho da organização social de trabalhadores rurais, que mantinham um hospital no município, a 164 km de Goiânia. O hospital mantinha convênio com o executivo municipal e estadual em uma mobilização ampla que seria chamada de “movimento popular de saúde”.
 
O primeiro secretário do SIMED-TO trazia consigo a experiência da atuação no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itapuranga. “Eu defendia outra coisa, outro nível de sindicato”, relembra.
 
Mas a outra vertente de atuação, como coordenador do MOPS por 10 anos, embasaria sua trajetória sindical.  “A minha preocupação quando a gente foi discutir código de ética médica, era para levar algumas conquistas que o Movimento Popular de Saúde já havia adquirido, tentar garantir que elas ficassem dentro do código, de ter possibilidade de fiscalizar o serviço público”.
 
Tratava-se de um período em que os médicos praticavam diversas funções em áreas diversificadas. “Vivia de tudo. De anestesia, cirurgia, parto, tudo, tudo se fazia, mas em Porto Nacional foi mais tranquilo, porque tinha uma equipe maior, tinha cirurgiões, os anestesistas, mas eu entrava em todas essas áreas, ficava nos plantões, cuidando da clínica, e também como preceptor do Internato Rural da Medicina da Universidade Federal de Goiás, mas sempre tive ligado aos movimentos populares, tanto pelo MOPS a nível nacional, e em Porto Nacional, fazendo esse elo da equipe com esses movimentos”.
 
Nesta época, o Governo Federal buscava inserir remédios de plantas medicinais no sistema de saúde em um programa da Central de Medicamentos, a CEME, criada na década de 1970. "E precisou formar profissionais em cursos no país inteiro. Eu fazia o curso em Goiânia, onde ficava uma semana por mês, depois voltava para Porto", relembra Evando Queiroz.
 
O curso serviu para aprimorar o trabalho fitoterápico da equipe de Porto Nacional no trabalho com comunidades, o que incluiu hortas em cada posto de saúde e discussões rotineiras com os moradores sobre o que tinha ali, o que servia e o que não atendia.
 
“Deixava aberto pra comunidade, era uma forma que a gente tinha de comunicação direta com a comunidade, era um momento que a gente tinha muita preocupação de resgatar o saber da comunidade, valorizar esse saber e tentar dar poder pra comunidade, através da comunidade do saber que ela tem de interferir nas ações do posto. Foi uma experiência muito bacana tanto do ponto de vista profissional, como do ponto de vista do cidadão mesmo, de você sair um pouquinho do pedestal de um profissional que é dono da verdade, essa coisa, dividir isso com as pessoas”.
 
Para o primeiro secretário, estas experiências contribuíram na discussão sobre o movimento médico no recém-criado estado, mas as pessoas participaram da fundação do sindicato mais pela projeção do médico Neilton Araújo. "Porque o Neilton tinha uma capacidade de conhecimento muito grande, ele arrastava as pessoas, mas a pessoa foi lá porque não teve como fugir dele, sabe?", conta, sob risos.
 
“Eu entrei no Sindicato não é porque tenho base sindicalista. Tenho nada. Eu entrei no sindicato porque tinha uma pessoa que eu admirava muito numa equipe, que queria fazer ali alguma coisa mais decente”.
 
O secretário relembra que os médicos organizaram uma comissão provisória para a organização do sindicato, criada dia 10 de fevereiro, como membros em Porto Nacional, Gurupi e Araguaína. Mas não havia muito entusiasmo, segundo o ex-secretário.
 
"Era loucura, a gente trabalhava durante o dia, pegava o carro, viajava a noite inteira, no outro dia cedo trabalhando, pra tentar organizar uma coisa que não empolgava médico nenhum, sindicato não tinha nenhuma empolgação de ninguém."- É vocês tão mexendo lá, muito bem, pode fazer isso aí", conta Evando Queiroz, sobre como os outros médicos viam a articulação.
 
Evando viajava com Neilton Oliveira nos próprios carros em que eram seus condutores. "Neilton era desses motoristas pé de chumbo, sabe. Eu lembro uma vez a gente saiu de tardezinha e se mandou pra Araguaína. Chegamos lá, fizemos uma reunião, terminou a reunião ali pelas onze horas (23h),a gente comeu alguma coisa e decidimos voltar, pois no outro dia cedo tinha que trabalhar. Aí o Neilton começou assim, a dormir no volante, saía para o lado direito, para o lado esquerda (da pista). Eu falei, Neilton, deixa eu dirigir um pouco? Mas ele tava tão apagado que não percebeu que ele saiu do carro. Eu comecei a dirigir, passou cinco minutos, ele começou a pegar no volante assim e bater o pé (imita a direção)".
 
Encabeçada pelo médico Neilton Araújo de Oliveira, presidente da comissão, e pelos médicos Evando Queiroz (secretário) e  Emerson José Ferreira Lima (tesoureiro), a comissão se empenhou no trabalho de divulgação e mobilização em todo o Estado, principalmente nas maiores cidades, relembra o secretário.
 
Em um dos últimos encontros preparatórios, realizados em Araguaína, uma semana antes da assembleia inaugural, os médicos definiram  a data de 18 de março de 1989, às 19 horas, como a data da assembleia de fundação do sindicato. A pauta trazia a criação, a discussão e a aprovação do estatuto e a eleição da diretoria e do conselho fiscal.
 
A criação foi prestigiada por outras entidades, como a Comsaúde, e pela comissão provisória do sindicato dos trabalhadores na saúde local, que também testemunharam a eleição da primeira diretoria, a escolha da sigla SIMED-TO, entre quatro propostas apresentadas para o nome da entidade, e a fixação da proposta básica do plano de trabalho para o sindicato nos dois primeiros anos.
 
O extrato da assembleia de fundação e seu estatuto foram publicados no Diário Oficial do Estado (DOE) de 1° de junho de 1989, na edição de n° 12, na página 18.
 
A primeira eleição do SIMED-TO elegeu uma diretoria com mandato de apenas um ano, assim composta:
 
DIRETORIA EXECUTIVA SIMED-TO (1989/1990)
 
Presidente: NEILTON ARAÚJO DE OLIVEIRA
Vice-presidente: SANDRA MARIA DEOTTI CARVALHO
Secretário Geral: EVANDO DE QUEIROZ
1º Secretário: CLÉBER MENDES MOTA        
Tesoureiro: JOSÉ NEWTON MOREIRA DISCONZI
 
Suplentes:
EMERSOM JOSÉ FERREIRA DE LIMA
FURTUNATO SOARES BARROS
AREOLINO LUSTOSA NETO
ROGÉRIO DERVAL DO BRASIL CARDOSO
ADELÍCIO PEREIRA DA SILVA
 
Conselho Fiscal:
HELOISA LOTUFO MANZANO
SOLIMAR PINHEIRO DA SILVA
ALFREDO OLIVEIRA BARROS
ADELSO OLIVEIRA DE LIMA (suplente)
LUCAS DAVI DE SOUZA (suplente)
 
Representantes junto a Federação Nacional dos Médicos:
NEILTON ARAUJO DE OLIVEIRA
EVANDRO DE QUEIROZ
 Suplentes:
LUZIA EUNICE GOMES DE SANTANA
PEDRO RICARDO INCHAUST